Camacha: um lugar e a identidade de um povo

 

Largo da Achada 1900 . Colecção do Clube Sport Marítimo.
Local do Campo da Achada onde se realizaram os primeiros jogos de futebol em 1875


Existe, nesta nossa ilha, um lugar amado por todos os que nele criam e criaram memórias e, nele, vêm parte da sua identidade.

Um lugar que guarda nas suas pedras histórias de milhentas vidas que por lá passaram. Vivências de infância, vivências da adolescência, de jovens, adultos, de famílias e também de terceira idade.

Nele existe também um património arquitetónico e natural que lhe confere uma identidade sui generis.

Há um amor pelo lugar que pouco mudou nos últimos 60 anos e que acarreta em si uma carga emocional de todos os que lá criaram as suas histórias.

Não é por acaso, muitos dos que lá despendem ou despenderam parte do seu tempo, sabem que os seus avós ou mesmo bisavós, pais e filhos também lá criam e criaram memórias e histórias. 

As memórias e histórias são de brincadeiras depois da escola com os amigos da infância, jogar à bola no ringue e aprender o “Tiki-taka” antes de um espanhol saber o que isso era e lhe dar o nome, de por vezes subir às árvores para ir buscar a bola quando lá ficava presa, porque fora "aliviada" por um amigo descontente com o resultado da "futebolada".

Largo da Achada 1909

São memorias das brincadeiras no parque infantil, correr no jogo da “apilhagem” e esfolar o joelho devido a um tropeção na correria desenfreada.

Recordações dos gelados refrescantes nas tardes de Verão e as brincadeiras de nós todos “encapotados”, nas tardes frias de inverno.

As memórias são também dos primeiros namoricos da adolescência e de conversas com os amigos, de sonhos e ideias partilhadas em amenas cavaqueiras à sobra das suas árvores em tardes de Verão que às vezes estendiam-se noite dentro, com a banda sonora vinda da “ROCK-OLA”.

As memórias são dos primeiros passos dos filhos e netos e das suas primeiras brincadeiras e correrias. 

São memórias de festas e encontros, de muitos bons momentos e de alguns não tão bons. 

Foto de Augusto João Soares


Acima de tudo é um lugar onde as suas pedras e as suas árvores foram e são parte integrante da formação de sucessivas gerações que por lá passaram.

Para mim e para milhares de outras pessoas o Largo da Achada na Camacha é tudo isto e muito mais.

Um verdadeiro coração de uma vila e pedra basilar de uma identidade individual e coletiva.

Sendo o um lugar tão presente e amado na vivência e memória coletiva de um povo, não é justificada a apreensão quando é apresentado um projeto para modificá-lo?

Reconheço que já necessita de obras de beneficiação, mas roubar-lhe a identidade, enchendo-o de betão, apenas contribui para destruir a identidade de um povo e da sua amada vila.

O Largo da Achada é dos poucos lugares na Madeira que têm escapado à “betonização” desenfreada que se assistiu nesta ilha nos últimos 40 anos. 

Os seus jardins e árvores são um património natural que deve ser catalogado e protegido.

A preservação dos materiais naturais, empregues na sua arquitetura, que lhe conferem carisma também não podem ser descurados.

O roubo da peça escultórica:

 

Sou a favor de obras de beneficiação que contribuam para melhorar os acessos para pessoas com mobilidade reduzia. Sou a favor da criação de melhores condições para os eventos que lá se realizam

Sou a favor de uma melhor rede de saneamento básico.

Mas não sou a favor da destruição do património natural já existente. 

Não sou a favor da “betonização” de um espaço urbanístico que, desde a sua criação na sua forma atual, primou pela utilização de materiais naturais como a pedra basáltica. 

Para finalizar deixo uma comparação com o filme italiano “Cinema Paradiso”, o Largo da Achada, para a maioria do povo da Camacha, tem a mesma carga emocional que o Cinema Paradiso tinha para o povo de Giancaldo. Ver a sua destruição será para muitos Camacheiros o mesmo que ver a implosão do Cinema Paradiso no final do filme, mas sem a banda sonora de grande mestre Ennio Morricone.

Aos responsáveis políticos do concelho de Santa Cruz peço-lhes que protejam este lugar de memórias e histórias.

Não o proteger é matar a identidade de um povo.

Antecedentes "criminais"? (imagens Funchal Notícias)



Enviado por Denúncia Anónima
Domingo, 31 de Janeiro de 2021 02:43
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