Douradas a preço de saldo!

 

N a semana passada, uma das grandes superfícies, mais precisamente o Pingo Doce tinha douradas em promoção, produzidas na Madeira. Até aqui nada de novo! O extraordinário é que as douradas, apresentavam um peso que variava entre 80g e 200g, segundo informação da etiqueta. E o preço também era surpreendente: apenas 2,99 EUR!!!

Achei estranho! Por isso, decidi examinar os espécimes expostos. Na realidade, as douradas eram muito pequenas (a maioria não alcançava os 120g) e, além do mais, muitas delas apresentavam deformações esqueléticas ao nível do opérculo, da mandíbula e da coluna vertebral. 

Anomalias estas que prejudicam não só o valor de mercado, mas também o custo de produção devido ao deficiente desenvolvimento das douradas afetadas. Daí a urgência do produtor em colocá-las no mercado, mesmo sem terem atingido o tamanho comercial e vendê-las abaixo do preço de custo. 

O que pode ter provocado estas anomalias? Vários estudos têm revelado diferentes causas para o aparecimento deste tipo de deformações, como por exemplo:

  • Deficiências nutricionais em ácidos gordos essenciais e vitamina C e excesso de vitamina A;
  • Factores abióticos, como por exemplo, a intensidade da luz, o pH, o oxigénio, o dióxido de carbono, a salinidade, a temperatura, etc.;
  • Factores bióticos, tais como exigências nutricionais, a densidade, o manuseamento, a estimulação hormonal, os parasitas, as infeções virais e bacterianas, etc.;
  • Agentes xenobióticos como os fungicidas, os herbicidas, os inseticidas, os efluentes, os metais pesados, os contaminantes organoclorados, os pesticidas, etc.

Pelo que acima foi referido, podemos constatar que o modelo de produção em aquicultura, está sujeita a factores que fogem ao controlo do produtor e que afetam negativamente o desenvolvimento dos peixes confinados e, consequentemente a sua qualidade. 

Por outro lado, ainda não é possível produzir rações, nutricionalmente equilibradas para peixes em cativeiro que sejam capazes de prevenir as frequentes malformações de que padecem. 

O outro aspecto a ter em conta são as patologias infeciosas, causadas por vírus e bactérias, também responsáveis pelas anomalias físicas, e que determinam a qualidade do produto final e em último caso provocam elevadas taxas de mortalidade. Estes focos serão tanto mais difíceis de controlar (através de antiparasitantes e antibióticos) quanto maior for a densidade de peixes dentro de uma jaula! 

E não menos importante, a poluição das zonas costeiras causada pelos efluentes urbanos e industriais, libertados no mar, sem tratamento, e pelas más práticas agrícolas.

Por tudo isto, fica claro que é importante investir mais no bem-estar animal das espécies produzidas em aquicultura, para que se possa obter um produto final de qualidade, o que manifestamente não é possível dentro de sistemas de produção de aquicultura intensiva, como aquele que é desenvolvido na zona costeira da Madeira.

Tendo em conta o tipo de alimentação das espécies aquícolas, com rações à base de peixe ou soja e atendendo aos prejuízos económicos, será que a aquicultura intensiva é uma alternativa sustentável à pesca? Não devemos esquecer que as rações elaboradas à base de farinha de peixe provêm de pequenos peixes capturados no ambiente marinho. Já as rações de soja procedem de explorações agrícolas, na sua maioria localizadas na América do Sul, cujos campos são, não raras as vezes, obtidos à custa da desflorestação ilegal de florestas.

Se os produtores não conseguem oferecer uma ração, semelhante à dieta selvagem, capaz de aportar todos os nutrientes necessários ao normal desenvolvimento dos peixes em cativeiro, e tendo em conta todos os factores que afectam negativamente a saúde das douradas, como poderá o consumidor confiar na qualidade dos produtos provenientes da aquicultura?

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Enviado por Denúncia Anónima
Sábado, 7 de Novembro de 2020 10:59
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