Madeira, 24 de abril de 2024



Manda quem pode, obedece quem deve. António Oliveira Salazar

E m 25 de Abril de 2024, 50 anos após o 25 de Abril de 1974, a Madeira regrediu social, económica e financeiramente. Na verdade, continuamos a 24 de Abril. Os protagonistas são outros, a cosmética politica (aquilo que chamamos de autonomia ) é que é diferente. 

A indústria dos países pobres, o turismo (massificação) aumentou, a dependência financeira e social do madeirense em relação ao governo aumentaram. Éramos pobres, continuamos pobres (e outros pobres de espírito ). Apenas mudou aquilo que se chama DDT – Donos Disto Tudo. Uma nova oligarquia de DDT´s, substituiu a antiga (que eu, confesso, até acho serem melhores, porque mais comedidos na banditagem e mais low-profile ).

Em 24 de Abril de 1974, poucos, é certo, tinham acesso à saúde, à educação (como no interior da “metrópole” ) e a Madeira tinha uma indústria turística de elite (que em 50 anos regrediu ). Poucos turistas, mas bons pagantes, vinham fazer despesa na Madeira. Como também em alguns locais da “metrópole”. 

A Madeira não era diferente de muitas regiões do país Portugal, da “metrópole”. Aliás, por causa deste turismo, até estava bem mais desenvolvida, pelo menos Funchal e concelhos limítrofes.

No país Portugal, nem tudo era assim. 

Se tirarmos os grandes centros (Lisboa, Porto, Coimbra, . ) e as regiões turísticas, nomeadamente o Algarve, a linha do Estoril, algumas termas, o país interior estava pior que a Madeira.

Figura 1 - tal qual a Madeira

Um exemplo pessoal (vou falar de Campo de Besteiros, mas poderia falar em centenas e centenas de vilas, aldeias e algumas cidades do interior da “metrópole” )

Nasci em Angola em 1964, em Ndalantando, ex-Salazar e capital da província do Quanza Norte (hoje Kwanza Norte). Vivia no Dondo, 190km a sul de Luanda. 190 Kms que fazíamos mais depressa do que de Campo de Besteiros, onde fui residir em casa dos meus avós maternos em 1976 fugido da guerra, a Viseu (35 kms).

Em Angola tinha (quase) tudo, até uma garrafa de coca-Cola (proibidas na “metrópole” ) de quando em vez, porque o meu Pai era …poupado. Tinha os livros de banda desenhada, da Marvel e DComics, o Michell Vaillant, o Axterix, o tim-Tim, Lucky Lucke, ….. coisas que eram novidade em Campo de Besteiros.

A minha mãe em Angola, ouvia radionovelas (lembro-me de uma chamada “simplesmente Maria” ), comprava a Burda (livro de lavores, crochet, … ), as Seleções da Readers Digest eram mensais, a National Geographic , ….

Na rádio ouvíamos os êxitos da moda. Sobretudo o rock americano e inglês. Claro que também existiam aquilo que os meus pais gostavam…. a musica pimba tipo Luís Alberto del Panamá (daí o meu nome).

O yé-Yé era ouvido e dançado, as calças de boca de sino usadas, os sapatos de boca larga, sola alta, de verniz colorido…. As camisas de gola e bico, os jeans, os carros da Matchobox, a pressão de ar, as minis-hondas, as sandálias de olhal feitas com borracha dos pneus dos carros, …. tudo isto existia e vestia-se em Angola. Muitos poucos no interior da “metrópole” conheciam. 

Figura 2 - é assim na Madeira

Não havia semana em que não visse filmes e quase todos os êxitos. Zorro, Tarzan, Bem-Hur, canhões de Navarone. Patton, Barbarela,.. (neste os meus pais colocavam a mão nos meus olhos e meu irmão nas alturas X… ). Em Campo de Besteiros, nicles.

Brincava com as colegas, aos médicos, papás e mamãs,  ….. saltar ao eixo, ao elástico, …mas tinha de ser, porque elas iam depois ser as índias nos nossos jogos de cowboys, eram as janes (nós o Tarzan)… No fundo, não eram miúdas para um lado, rapazes para outro, como era no interior da “metrópole”.  Nada.

A minha escola primária era preferencialmente branca (80% e tive uma colega que entrou na 3ª classe que era madeirense e se me estiver a ler, dê um toque ). A do meu irmão era o contrário: 80% eram colegas de côr. Em Campo de Besteiros, como ainda hoje na Madeira, os alunos das “elites” para as melhores escolas. 

Claro, os cortes de cabelo…todos seguíamos a moda dos Beatles. No interior da “metrópole” era o corte à barrela (e como fiquei envergonhado depois de um destes em 1976 ficar com as orelhas à mostra ).

Luz existia em todas as ruas, telefone em quase todas as casas, fogão, máquina lavar roupa, esquentador, frigorifico, ….. Ahhhh, gelados de cone, da Olá e tínhamos gira-discos e discos.
Em Campo de Besteiros, concelho de Tondela, a 35 km de Viseu e 16 km do Caramulo, nada disto existia. Até a cor das roupas era diferente, a maioria escura. 

Campo de Besteiros era uma vila em Y e era esse Y que tinha iluminação pública. O resto era nas casas e nas mais antigas apenas em 1\2 divisões (e noutras velas e candeeiros a querosene). Em casa dos meus avôs materno/paterno existia um WC mais “moderno”  (nos meus tios avós fazia-se na casinha, fora da casa principal), mas a água era aquecida na lareira e levada à mão até a banheira/alguidar grande, onde se tomava banho 

Figura 3 -  como no psd-M e ps-M recentemente. Quem discorda, rua.

Muito poucos ou quase nenhuns colegas meus tinha lido uma BD, de “Homem Aranha”, desconheciam o Michell Vaillant, …. Músicas? Na rádio era o fado e só depois com os irmãos Pego e António Sala (vindos de Angola ) é que muitos começaram ouvir os primeiros acordes, por exemplo, dos Rolling Stones, Supertramp, …

O meu Pai em 1984 fez um supermercado em Campo de Besteiros. E era ver gente a ir ao supermercado ver o feijão em pacotes, as ervilhas numa lata e o peixe fresco (nessa altura o peixe que se comprava no concelho de Tondela, vinha da Figueira da Foz (190 Km´s por más estradas ) e era vendido por mulheres de Molelos numa cabaça que ia de rua em rua. A frescura do peixe.. a água e bicados de gelo que colocavam (não acontecia em Angola- o meu tio paterno vivia em Calulo num entreposto no meio de nenhures e até ele tinha eletricidade, frigorifico, arca, … ).

Em Campo de Besteiros, uma das 3 zonas avícolas de Portugal, a única indústria eram os laboratórios Labesfal (hoje Genéris) mas o dono, o grande benfeitor de Campo de Besteiros, Dr. Almiro, porque também era o provedor da Misericórdia tinha uma política salarial e social muito engraçada: mulheres, baixos salários, contratos de trabalho em roulement e quem não fizesse muitas ondas tinha os filhos na creche da misericórdia a custo 0. Quem fizesse ondas …. Hoje faz-se o mesmo na Madeira. 
Os homens emigravam, essencialmente Luxemburgo, França e Alemanha.

Escola ? era a mais básica apenas. Com 14 anos, estávamos bem era ou para trabalhar nos campos ou, caso do meu avô materno em relação a mim e meu irmão, na carpintaria dele.

Fui o primeiro da minha geração a ir para a universidade e os meus pais foram criticados por me enviarem e ao meu irmão para estudar primeiro em Tondela (7 kms, até ao 9º ano ) e depois Viseu (até 12º ano, ficando lá durante a semana).

O meu Pai tinha uma expressão que ainda hoje recordo com saudade. Dizia ele, que esteve 40 anos em Angola, mas que “nunca viu tanto preto como em Campo de Besteiros”. Ou em Viseu, ..ou em ….
È que as pessoas em Campo de Besteiros eram exploradas. E se olhássemos para o interior do país, a situação era a mesma (até nas áreas mais industrializadas).

A Madeira era EXATEMENTE IGUAL AO PAÍS. NEM MAIS NEM MENOS. E HOJE AS COISAS NÃO MUDARAM, como sabemos. Existe ainda muito “preto” na Madeira. Nunca em Angola, ouvi gente a ameaçar mulheres, como na madeira (e recordo o que se passava na ALRM, com Jardim, os Ramos, … em relação a uma Guda Vieira, Violante Matos, …. ). Ou hoje ….. 

Na Madeira de 2024, cada vez existem mais “pretos”. Os valores do trabalho são cada vez menores, comparando com 1974 e os antigos “donos disto tudo”, os “ingleses” dizia Jardim, foram substituídos pelos novos “donos disto tudo”: Os sousas, os avelinos, os ……..

Um antigo contabilista meu, dizia que pelo barulho de um carro nas ruas do Funchal em 1974, se sabia quem era o dono. Mas em campo de Besteiros, em quase 90% das localidades do continente português, também se poderia dizer o mesmo. Em 1976 em campo de Besteiros, talvez existissem no conjunto uns 11, 12 …. 

Dizem-me que em 1974 havia galinhas a passear no Funchal. Em 1980 em Viseu, havia gente a tirar bacios de xixi para as ruas pelas janelas (zonas antiga).

Desde a entrada de Portugal na CEE/UE, cerca de 180 mil milhões de euros entraram no país (inclui Madeira).

Desde 1974 a Madeira tem os seguintes registos financeiros (macro )
  1. Orçamentos regionais: média de 1 000 milhões/ano, dá 50 mil milhões
  2. Dividas pagas ( Guterres ) : 2 vezes, 16 mil milhões
  3. Lei de meios (Sócrates ): 1 000 milhões
  4. Divida atual (oficial ): 6 000 milhões
  5. Valor de apoios comunitários entregues: 30 000 milhões
  6. TOTAL: 103 000 milhões de euros.
  7. A Madeira não é contribuinte liquido social (pensões, subsidio de desemprego ) em relação ao orçamento de Portugal nestas áreas (recebe mais do que entrega )
A Madeira NÃO contribui para o orçamento da CEE/EU, mas sim o estado português, que não é contribuinte liquido (recebe mais do que dá).

Figura 4 - como na Madeira

Nestes 50 anos, na Madeira, fizeram-se estradas, construíram-se lares, centros de saúde, um novo aeroporto foi feito (70% com participação do orçamento português ), mas se fizermos uma soma contabilística destas benesses todas, nunca atingirá os 103 000 milhões de euros que aqui entraram. 

A Madeira, contabilisticamente falando, no investimento público, vale bem menos que 103 000 milhões de euros (não me refiro ás gentes, nem à ilha, apenas ao realizado/pago, nestes 50 anos) que recebeu.

E se juntarmos todos carros, motas, barcos, casas, …. Dos madeirenses, mesmo essa soma mais o investimento público, fica aquém dos 103 000 milhões de euros (cerca de 23 000 milhões)
Para onde FOI O DINHEIRO EM FALTA ?
 
Ter mais carros, hotéis, casas, restaurantes, hipermercados, centros de saúde, escolas, … confunde muita gente com desenvolvimento (social, económico, … ). Ter bens, não significa nada. A Arábia Saudita, o Koweit,…. são desenvolvidos, mas são das regiões do mundo onde o fosso entre ricos e pobres é maior.

O 24 de Abril não chegou à Madeira.

Mas chegou sim à Madeira em todo o seu esplendor e glória, um 25 de Abril de bandidos, de criminosos, de cada vez mais dependentes. Esta terra, esta ilha, não é uma pérola do Atlântico, nem será seguramente uma Singapura do Atlântico.

É sim uma Rússia do Atlântico. 
Não temos um Putin, mas temos um Albuquerque.
Não temos um Nicolai Kharatinov, ou um Baburin, mas temos um Cafôfo…
Não somos uma democracia, somos uma democratadura
(felizmente não temos polícia secreta e a internet é regulada pelo estado português, caso contrário, o CM estava bloqueado. E eu, e tu, ….. e quem quer manter este estado de coisas votando sempre nos mesmos ).

Luís Matos

Enviado por Denúncia Anónima
Quinta-feira, 25 de abril de 2024
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