Monarquia vs República


A propósito do exuberante “show-off”, do que tem sido o funeral de Isabel Windsor, falecida rainha da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, ressuscitaram os apaniguados da monarquia, uns por via das revistas cor-de-rosa e cores afins, outros por intermédio de veículos de comunicação mais sérios, como, por exemplo, o DN-Madeira.

Por estes dias, um cronista regional veio questionar, branqueando, a questão da legitimidade da monarquia, utilizando o argumento fácil, porém falacioso, de que os países monárquicos europeus funcionam bem, na perspetiva da mundividência democrática ocidental que assumimos comummente como nossa.

Efetivamente, esses países funcionam bem, no sentido em que são governados por cidadãos comuns que, em algum ponto das suas vidas, decidiram candidatar-se a lugares políticos sujeitos ao escrutínio dos seus concidadãos, - para além das instituições de fiscalização próprias do estado constitucional democrático -, são escolhidos mediante sufrágio direto, livre e democrático, e  que regularmente (e enfatizo, perante recentes tomadas de posição, a regularidade constitucional e política), são substituídos ou confirmados, precedendo idêntica designação,  por outros cidadãos.

Os monarcas desses países são perfeitamente irrelevantes no que toca à governação e às decisões políticas que são tomadas.  Com a única exceção, no século passado, em circunstâncias históricas absolutamente extraordinárias e, quiçá, irrepetíveis, da intervenção de Juan Carlos de Espanha – e designado herdeiro do poder pelo Caudillo Francisco Franco, perante o avanço das forças do fascismo. São manequins de protocolo.  A sua influência na efetiva governação dos seus países é nula. São figurantes para as revistas cor-de-rosa e vão excitando a imaginação dos que vêm os palácios reais como miragem, enquanto gastam quantias substanciais do Tesouro dos países que alegadamente representam

Isabel Windsor nunca foi eleita pelos seus concidadãos, para qualquer dos postos que ocupou; limitou-se a nascer filha primogénita de um hipotético herdeiro da coroa real, o qual, por circunstâncias diversas e na sequência de regras, tão obsoletas, como absurdas, veio a ser proclamado,  rei de um país unido à força e imperador de um Império que a força da História vinha a consistentemente derrubar. 

Um acidente de berço, aliado a intrigas de alcova, preconceitos oportunistas (relembro o divórcio de Henrique VIII) e simpatias suspeitas, alcandorou Isabel Windsor a rainha. Juntamente com o seu conjugue e primo consorte, cumpriu escrupulosamente, o reportório das regras palacianas, reproduziu-se com a abundância necessária e manteve os rituais e aparências necessárias para que não fosse colocada a hipótese da sua substituição enquanto Chefe de Estado. O que, no caso do Reino Unido não foi tão unânime como agora se quer fazer passar  - veja-se, para só falar de eventos recentes, o referendo sobre a independência da Escócia, que não tinha um rei sucedâneo ou, mais atrás, a emancipação da República da Irlanda- ; mesmo a decantada Commonwealth – solução bastante cínica que o imperialismo britânico achou para permanecer nas colónias, sem estar por cima – está, há muito tempo, em debandada e não quer saber de novos chefes de estado ingleses em países que, em nada, salvo na história comum e nas relações diplomáticas, lhes dizem respeito.

Se deduzirmos o ritual da Corte e o mediatismo que se acelerou nos últimos anos, o “reinado” de Isabel Windsor foi quase irrelevante. Foi um ícone de um Império de há muito perdido e que se foi degradando e, nos últimos anos, foi navegando nas águas turvas e inseguras da mediatização a que a dita casa real foi exposta: desde os lamentáveis episódios da nora real - rapidamente endeusada como princesa celestial e impoluta nos media internacionais-  e da demais parentela, incluindo chupanços de dedos e aventuras pedófilas, até aos desvarios mal humorados do mimado príncipe real (recentemente divulgados pelas TV mundiais, já na pele de rei), Isabel foi gerindo a comunicação e gerando a imagem de alguém que estava bem acima de tudo e de todos.

Durou muito! Até ver (temos de esperar pelo fim de Putin), mais que todos os autocratas dos séculos XX e XXI. Foi autocrata porque o povo nunca foi chamado a dizer que a queria como chefe de Estado. Deixou uma fortuna espantosa que vai passar aos seus herdeiros, sem o imposto sucessório a que o comum dos cidadãos britânicos está sujeito. Para além das funções protocolares, nunca produziu alguma coisa de útil à sua nação e ao mundo. Com exceção é claro de umas criações de cavalos e cachorros de raça que, rezam as crónicas, patrocinava.

Não obstante, neste momento, raros são os que negam que teve um incomensurável papel no mundo moderno, e – a atestar tal atributo – multidões fizeram filas quilométricas para ter o duvidoso privilégio de vislumbrar a sua urna, incluindo a maior parte dos chamados líderes mundiais.

Depois da verificação desse espetáculo deprimente, volto à proposição inicial.

Será a monarquia, mesmo que constitucional e vigente num país democrático, um regime aceitável?

Se tivermos por seguro que Nenhum Ser Vivente, nasça onde nascer, tem o direito, outorgado por qualquer deus ou outra entidade, que não seja o povo, de nos representar, como representante da Nação a que pertencemos, não há rainha ou rei, chame-se Isabel ou outro nome, que se possa arrogar esse direito.

O Chefe do Estado é ao cidadão que resulta da escolha livre e democrática do seu povo. Desejavelmente, será o melhor entre os cidadãos: “PRIMUS INTER PARES”.

VIVA A REPÚBLICA!

João Fernandes

Enviado por Denúncia Anónima.
Segunda-feira, 19 de Setembro de 2022
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