Orgulho de ser madeirense?


P odemos dizer cobras e lagartos de Alberto João Jardim, mas a verdade é que Jardim tinha uma vocação popular que galvanizou o povo madeirense, ele sabia cativar o povo e fazer do madeirense um povo orgulhoso da sua autonomia, história e identidade. Ele sabia entreter o povo, sabia mobilizar o povo e sabia interpretar o espírito popular dos madeirenses.

Claro que isso também tinha um lado sombrio e obscuro, a própria ideia de “povo superior” provoca asco aos mais cultos e formados, mas era um mecanismo de reivindicação da autonomia face ao poder de Lisboa, ao monstro do centralismo. Portugal tem um grave problema de centralismo, Lisboa concentra a maior parte da riqueza e prestígio do país. E Jardim era uma das raras figuras nacionais que sabia explorar esse sentimento perante a capital. Ele não era só popular na Madeira, era uma figura nacional.

Vejo muita gente incluindo aqui no CM a atirar berlindes à cabeça de figuras como Miguel Albuquerque, Pedro Calado ou Rui Barreto. É certo que nenhuma destas figuras tem vocação popular, são pessoas que não sabem cativar a imaginação dos madeirenses. Mas temos de ver que a entrada em cena de Albuquerque foi uma tentativa do PSD tentar superar as lacunas de Jardim. Albuquerque tem qualidades, é um tecnocrata que está ligado às empresas. É um indivíduo que se preocupa com os assuntos da região como se fosse um gestor ou um CEO. Quer manter o barco à tona, e ainda há um eleitorado de classe média que preza isso. Mas onde Albuquerque acerta dificilmente pode compensar onde falha.

Primeiro, a pobre gestão da Administração Pública, com demasiados cargos de nomeação e más chefias. Depois, algum descuido na gestão de certos dossiers e uma inflexibilidade em ouvir a voz do povo. Dito assim, o que aconteceu? Os madeirenses sentem-se órfãos. Albuquerque não sabe chegar ao povo e isso fez com que os madeirenses perdessem o orgulho pela autonomia. Quem hoje tem orgulho de ser madeirense?

Albuquerque é um bom gestor, mas não é um mago das emoções. E sinto que há um profundo desgaste na identidade popular madeirense. Este dilema tem consequências, Albuquerque é inclusive um tecnocrata no domínio social, é capaz de encher barrigas mas incapaz de elevar a dignidade, nem que seja pela exuberância como Jardim era um ás. Albuquerque também não se adaptou bem às novas tendências, nomeadamente, no que toca ao papel das mulheres na sociedade, os jovens e o domínio socialista na república. Não é uma figura nacional e não desperta simpatias no quadro institucional português.

Sou daqueles que acham que isto precisa de uma mudança, mas ainda acho que o PS não é a solução. Explico com simplicidade, o PS não quer mudar o regime, quer apenas ocupar o espaço do PSD no regime. E depois, o PS também não tem uma vocação popular que toque no espírito dos madeirenses. É um partido de tecnocratas com ideias importadas e alguma falta de honestidade intelectual. O PS tem uma figura que poderia dar fôlego e profundidade, o Miguel Silva Gouveia, mas este parece que foi entregue aos leões e deixou de ser um trunfo dos socialistas - o que é pena.

É por isso que acho que as próximas eleições têm um vácuo. Não há candidatos com cariz popular. O JPP ou o Chega podem tentar cativar esse eleitorado, mas não me parece que tenham talento para tanto. Se isto continuar assim, o ressentimento e a mesquinhez dos madeirenses uns com os outros vai continuar a azedar.

Temos muitos problemas de cariz social que vão piorando sem que ninguém pegue neles. Daí que acredite que há espaço para a formação de um partido na região com vocação popular que reabilite o orgulho de ser madeirense. Não falei do IL, do BE e da CDU. O IL pode ser um trunfo para os trabalhadores do sector privado, o BE e a CDU parece que definharam completamente. Mas a questão é esta, precisamos de um partido que não seja mais um partido de nicho. Precisamos de um partido que seja um partido de união entre as classes urbanas e as classes populares. Precisamos de voltar a ter mobilidade social - que não temos. E precisamos de recompor a autonomia no quadro da política nacional.

O PSD perdeu essa vocação e parece que vai ganhar apenas porque não há ninguém que tenha a coragem de assumir a luta.

Enviado por Denúncia Anónima.
Terça-feira, 28 de Junho de 2022
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