E ntão que se comece pela definição de saúde, segundo a OMS: "O conceito de saúde, mais do que ausência de doença, representa uma situação de completo bem-estar físico, psíquico e social. Inclui também a adequação do sujeito individual ao meio em que está inserido (...) resulta duma contínua intenção individual no sentido de gerir a afetividade, evitar atitudes e hábitos nocivos, e fazer vigiar regularmente certos parâmetros clínicos e analíticos".
"Ausência de saúde", "gerir afetividade, evitar atitudes e hábitos nocivos" e "vigiar" ... serão conceitos que preocupam atualmente quem comanda o nosso sistema de saúde em todas as idades, fases da vida? Não parece!
Pelas atuais diretrizes do sistema de saúde da RAM, a região andou largos anos atrás nos cuidados prestados à saúde infantil, coloca-se de parte a doença aguda. O conceito de intervir para a ausência da saúde e mesmo para a qualidade de vida em crianças com doenças crónicas, em outras áreas que não o covid deixou de ser, ou nunca o foi verdadeiramente, preocupação pelos atuais responsáveis.
A saúde infantil (vamos deixar de parte vacinas e doença aguda) tem sido sempre descurada e com pouco investimento. É visível este comportamento nos cuidados de saúde primários, onde deixou de ser possível uma atuação preventiva para a promoção do adequado desenvolvimento, quer dos bebés e das crianças. Os profissionais que atuam com esta população fazem o possível e o impossível para conseguirem atempadamente sinalizar problemas ... mas não!!! As diretrizes atuais é que não vale a pena a "preocupação" antes da instalação efetiva do problema.
Quando a criança apresenta a perturbação já adquirida com consequências em todas as areas do desenvolvimento (comportamental,psicomotor, cognitivo, comunicação linguagem, aprendizagem escolar, socialização, etc...).... AÍ sim que seja sinalizado para a primeira consulta, que obviamente terá o seu tempo de espera. Finalmente a data da consulta é agora que será "tratado" (pensam os pais) ... NÃO ainda não foi desta! agora terá de ir para outra. Provavelmente deverá ser muito em breve, afinal já foi visto por um médico (pensam os pais) ... NÃO! lá terá que esperar mais um pouco. 1, 2, 3 meses ... Finalmente chega o dia! o "tratamento" .. que NÃO É um comprimido prescrito de 8h em 8h durante 15 dias. São intervenções feitas por técnicos com formação superior e especializada nas diferentes areas de atuação no desenvolvimento. Desde a psicologia, às terapias e à educação com a ajuda de outras (enfermeiro, assistente social, nutricionista, etc...) onde associam a afetividade ao conhecimento cientifico para intervir com a criança e com a família em todos os seus contextos.
Façam lá as contas do tempo é que esta criança perdeu à espera?... pois é , esquece-se de dizer que muitas destas "perturbações do neurodesenvolvimento" não são logo visíveis a "olho nu"nem se conseguem medir como a febre... Mas diz a ciência que todos os sinais estão lá desde o primeiro dia de nascimento. ONDE ESTÁO OS PROGRAMAS DE VIGILÂNCIA? OS CUIDADOS PARA A PREVENÇÃO?
E com isto lá vem a GRANDE NOTICIA!! Um dos serviços que em tempos atrás foi considerado a nível nacional um dos melhores centros de desenvolvimento do país, pela forma como estava organizado e pelo seu funcionamento, sendo referência para o "nascimento" de outros vai deixar de existir! ... Nos jornais de há 21 anos atras fazia-se noticia com o seu nascimento, hoje faz-se noticia do seu enterro!
Não .. não é a mudança de local que faz terminar, o Centro de Desenvolvimento da Criança (CDC) do HNM, enquanto centro de desenvolvimento (faltam as linhas ... aos interessados procurem a definição e objetivos de um CDC). O CDC vai ser jogado para outro local. Vai deixar de estar num local que foi construído de raíz a pensar no seu funcionamento e vai deixar de existir uma equipa multidisciplinar, que avaliava a criança de forma holística através de uma abordagem multissistémica. Onde a criança não precisava de ir bater a tantas portas de tantos serviços.
O CDC vai passar a ser um "armazém" onde serão colocados os terapeutas... E como sempre, pelo perfil que os caracteriza por quem os conhece nestes 21 anos, de certeza irão dar o melhor que puderem.
Será isto "SAÚDE" no século XXI? ... Poderia-se nomear vários exemplos de outros países .. onde o "antigo" CDC fazia parte. Mas o "poderio" é sempre assim ... vamos lá dar cabo do que funciona minimamente bem.
Outro aspeto que trouxe estes tempos, foi que, o que antes era deixou de ser! A contratação de profissionais sem a existência de um concurso ... afinal é possível! O estado de emergência assim o permite. Mas bem PIOR ainda, é ser feita uma contratação com entrevista em que o coordenador/diretor responsável da categoria profissional não está presente nem é chamado a opinar ... Provavelmente poderia ser uma ajuda em avaliar o candidato quanto ao conteúdo profissional.
Deixar esta mensagem, será dar VOZ ao que sente o coração de muitos pais, de muitas famílias, de muitos profissionais. E não pensem que estes jã não tentaram chegar até "lá em cima"...
Pensar que o "amanhã" será as crianças do "hoje" ... que não exista apenas a preocupação com elas nos dias comemorativos, como no "dia do pijama" ou no "dia da criança"!
Os países desenvolvidos praticam politicas de saúde com a visão de melhorar os cuidados ao nível da saúde materna e infantil, não apenas com a preocupação da doença aguda ou com as vacinas ... Direciona politicas para a implementação de programas que promovam o neurodesenvolvimento e a saúde mental na primeira infância.
Quanto às mudanças, claro que tem de haver! Que se chamem readaptações de acordo com o contexto atual ... mas que sejam feitas OUVINDO os interessados através de uma comunicação bidirecional. Este deveria ser um comportamento a adotar por quem "comanda as tropas" ... ao contrário do suposto dialogo com ideias pré-concebidas, sem direito a "cedências" de quem tenta "demonstrar" que estas mudanças/readaptações NÂO SÃO de todo promotoras na qualidade do serviço a ser prestado ao utente.
Fica a sugestão ... na esperança que a leitura deste "desabafo" toque a razão e o coração de alguém que possa intervir nesta situação ... OUVINDO a quem de respeito.
