Contestação à construção da Estrada das Ginjas

 


J unto envio ficheiro com o teor da minha contestação ao estudo de impacto ambiental "Estrada das Ginjas" que deu entrada no portal Participa.pt (link).


1 – Os objectivos do projecto são questionáveis:

  • Lançar 9,25 Km de rede de rega e de incêndio numa zona onde nunca houve um incêndio, e numa área que não está inserida na Reserva Agrícola.
  • Criar um impacto positivo pela aproximação das povoações. No estudo não existe qualquer métrica sobre este assunto. Ainda mais porque não existem povoações no Paul da Serra. S. Vicente está muito bem ligado ao Sul da Ilha através das vias já existentes, que não têm a densidade de curvas da proposta Estrada das Ginjas. Ver mapa anexo. Portanto este caminho não trará vantagens ao nível comercial, cultural ou social.
  • Dinamizar o Turismo e o tecido económico da região,quando mais uma vez não existe qualquer quantificação do efeito previsto. Quanto ao Turismo as novas tendências são a procura de sítios intactos, e com mistério. Sítios até de difícil acesso. Um centro de Interpretação da Laurissilva é simplesmente arranjar mais um edifício para ficar ao abandono, como aquele que se encontra no Lugar de Baixo, para não falar de outros, ou para mais tarde ser transformado em Bar/restaurante.

2 - A área em estudo insere-se na Rede Natura 2000 (115), desde 1992, “pertence à Rede de Reservas Biogenéticas do Conselho da Europa, por apresentar inegáveis valores naturais e carácter de unicidade, o que corresponde a um reconhecimento de enorme importância pela comunidade internacional.”Mais concretamente, na área de estudo existem 2 habitats protegidos, e que pela sua classificação, não deveriam de poder sofrer grande interferência humana, que são a Laurissilva e charnecas macaronésia endémicas.

3 - Desde 1999 foi integrada no Património Mundial da Humanidade, por “ ser a maior mancha sobrevivente de Laurissilva, a nível mundial, “constituindo-se uma importante floresta climática relíquial, que reúne importantes serviços ecológicos (como por exemplo ao nivel do balance hídrico da Ilha). Em 2010 a Laurissilva foi classificada como de Excepcional Valor Universal.

4 - A Laurissilva da Madeira no seu estado climax não arde, devido aos elevadíssimo grau de humidade neste ecossistema.

5 - A abertura da Estrada abre a porta à entrada de espécies invasoras, nomeadamente ás giestas e carquejas que são altamente inflamáveis, em que o fogo promove a sua propagação.

6 - Numa palestra sobre incêndios florestais na ilha da Madeira, em Outubro de 2016, Tiago Oliveira  foca nos factores que estão a agravar o risco de incêndio, que entre outros, incluem um crescimento da área de eucaliptal, folhosas e resinosas diversas, assim como acácias. A Floresta Natural (Laurissilva e ripícolas) nos 6 anos entre 2004 e 2010 reduziu-se em 789ha.

7 – Tiago Oliveira foca também o facto de o fogo resultar da “interação entre a vegetação, a meteorologia e o terreno, sendo catalisado pelos comportamentos do homem, ora na forma com ousa o fogo indevidamente ou estabelece o mosaico da vegetação e o seu uso”. No próprio EIA, na página 129 explana que a perturbação por intervenção humana resultou em alguma descaracterização da floresta devido a presença de espécies exóticas, ornamentais e cultivares. Isto verifica-se especialmente nas zonas contiguas ao caminho existente!!

8 - Na área do estudo foram identificados 31 espécies endémicas da Macarronésia das quais 20 são endémicas da Madeira (página 127 do relatório).

Destacam-se os Adernos e Feto-grandes classificados como Vulneráveis à extinção! Assim como Cedro-da-Madeira em perigo de extinção.

9 - Foram identificadas 30 espécies exóticas e invasoras tais como a Mimosa, Abundância, Cana, Vidoeiro, Hastes de São Lourenço, Entrometidos, Eucaliptos, Traqueira, etc

Estas invasoras ocupam os nichos de desenvolvimento da flora e vegetação nativa, e consequentemente impedem o desenvolvimento da flora original. Inclusivamente, o estudo aponta para a causa desta flora invasora, como a atividade Agrícola, o uso da via e as operações de manutenção da via! (página 138)

O efeito a médio/longo prazo da introdução destas espécies invasoras e das alterações dos habitats ao longo desta Estrada são:

  • Alteração das condições climáticas ao longo da Estrada e da faixa de vegetação alterada
  • As alterações climáticas agravarão o ponto anterior, como consequência do aumento da frequência das ondas de calor, e portanto o perigo de incêndios;

Estes dois factores conjugados nomeadamente com as espécies invasoras mais inflamáveis, cujo fogo promove a sua propagação, serão um processo de destruição que se auto-alimenta.

10 - Foram identificados 16 espécies de aves, das 25 potencialmente ocorrentes na área. Bis-bis, fura-bardos, manta, francelho, coruja das torres, Pombo domestico, tentilhão, lavadeira, melro e toutinegra. Nada é dito acerca da importância destas espécies.

11 – O EIA refere que os Morcegos que potencialmente existem na área de estudo, nomeadamente o morcego da Madeira (Pipistrellus maderensis) apresenta maior estatuto de protecção e conservação. Está classificado como CRITICAMENTE Ameaçado de extinção no arq. da Madeira.  DEVERIA SER FEITO UM ESTUDO UNICAMENTE SOBRE ESTES MORCEGOS.

Enquanto no resto da Europa tomam-se medidas para aumentar áreas verdes, e proteger locais vulneráveis; enquanto o desafio de Bona (lançado em 2011) pretende restaurar 350 milhões de hectares de floresta até 2030, não se entende a posição política tomada na R.A.M. 

CONCLUSÃO

A abertura de uma Estrada na Laurissilva, independentemente do local, vai criar as condições propícias para o aparecimento de fogos ao longo do seu itinerário, como consequência da alteração profunda dos habitats ao longo da Estrada. Ao comprometer a Laurissilva, estaremos também a comprometer a captação de água com todas as consequências, ecológicas, económicas, etc, incluindo um impacto negativo inquantificável em todos os sectores da economia da ilha, nomeadamente o turismo, e agricultura.

MEDIDAS A TOMAR:

1 – Acabar com a circulação de todos os veículos, excepto dos serviços florestais, nas áreas da Laurissilva.

2 – Fazer uma limpeza profunda das espécies infestantes ao longo deste caminho de terra, assim como de outros caminhos

3 – Monitorizar e publicar os resultados dessa monitorização, a extensão e qualidade da Laurissilva

4 – Fazer protocolos com a Universidade da Madeira e outras, assim como canalizar verbas para o estudo dos:

  • Insectos, Morcegos, e pássaros,
  • Das propriedades das plantas endémicas da Laurissilva

6 – Utilizar o abandonado centro de estudo dos Patos no Lugar de baixo, ou outro edifício construído recentemente e votado ao abandono para um centro de protecção e educaçãos obre a Laurissilva, 

7 – Promover junto das escolas acções de sensibilização sobre a Laurissilva, sua importância e fragilidade.

Segunda-feira, 8 de Fevereiro de 2021 16:50
Todos os elementos enviados pelo autor.