Covid: Oportunidade Perdida


As crises são uma Oportunidade? Sim, são na medida em que possibilitam a Mudança pois:

  1. Mostram à Sociedade a necessidade de mudança, um tempo para a executar;
  2. Essa necessidade percecionada faz com que os sistemas permitam Mudanças; faz com que os atores (cada qual com a sua agenda de interesses) tentem estabelecer um novo equilíbrio (ou homeostasia), através de novas alianças e novas práticas políticas.
  3. Cada Crise tem um conjunto único de problemas, e esse conjunto pré-configura a solução. A crise de 2008 foi financeira, pelo que a solução foi financeira. O Covid é uma pandemia que tudo afetou …
  4. Para além de permitir a criação leis e regras, as Crises fazem com que essas mudanças discutidas sejam apoiadas e executadas pela Sociedade. Não basta legislar.

Embora poucos se apercebam, as teorias económicas têm uma base moral subjacente. Adam Smith (Liberalismo), Karl Marx (Comunismo), Keynes (intervenção do estado na economia), Beveridge (estado social) e Thatcher (neo-liberalismo) com base na sua moralidade e ideias, alteraram a economia. Não admira que a Economia seja uma Ciência Social.


Ao longo desta Crise, descobrimos:

1 O Estado tem poder excessivo. Tomou as medidas que lhe aprouve, a Oposição calou-se ou apoiou, as empresas ficaram mudas, os trabalhadores ficaram silenciosos. Até mesmo os adeptos da teoria da conspiração tiveram muitas dificuldades em passar a sua mensagem. Este poder excessivo manifesta-se pela Ausência de Contrapoder. Os Corolários deste facto são:

  • Empresas cumpridoras de todas as suas obrigações legais foram fechadas, e não houve ninguém que defendesse que Estado as devia indemnizar. Mesmo agora, três meses após o início do confinamento, os empresários da noite e do desporto continuam a pedir permissão para abrir, e algum apoio, ao invés de exigir indemnização por violação dos seus direitos.
  • O fecho dos aeroportos nas Regiões Autónomas. Todos sabiam que era ilegal e inconstitucional e nenhuma Autoridade de Contrapoder (Oposição, Tribunais, Ministério Público, Provedor de Justiça e Presidente da República) por sua iniciativa a contestou.

Todos os sistemas políticos baseiam-se numa divisão de poder e contrapoder por organismos (especialmente nas Monarquias). Aqui em Portugal não há Contrapoder, pelo que não há crítica, e consequentemente não há pensamento profundo sobre a atividade pública. Portugal é um navio que vai fatalmente contra as rochas.

O cidadão português é demasiado manso para enfrentar o poder do Estado Português. Talvez por recear perder a sua fonte de rendimentos…Talvez por maltratarmos nossos heróis. Talvez por acreditarmos que a Vida é um sofrimento.

2 Todos consomem a mesma informação, e é por este meio que o Estado impera. Vimos isso nos avanços e recuos das opiniões do Ministério da Saúde, em que a Oposição manteve-se calada. Até parece que os partidos da oposição não tentaram arranjar um seu próprio perito nesta questão do Covid…

Os peritos estatais não sabiam muito mais que o português comum.

3 A atividade humana tem impacto no ambiente (exemplo. Níveis de poluição em certas cidades que decresceram abruptamente). No entanto, não conheço nenhuma medida pró-defesa do ambiente que esteja a ser desenvolvida

4 Percebemos quais as profissões indispensáveis à nossa economia. Também sabemos que as formas de trabalho podem ser diferentes: mais eficazes e eficientes. Há demasiados funcionários públicos. Não faz sentido tantos trabalharem tanto.
No entanto, estamos todos a voltar ao trabalho para continuar a cometer os mesmos erros. Poder-se-ia repensar o trabalho (atividade na qual gastamos a maior parte do tempo de nossa vida) tendo em conta que:
  1. a tendência é para maior precaridade laboral (para a qual a Segurança Social não tem instrumentos adequados para combater);
  2. ter um emprego ou trabalho atualmente não é indicador de não-pobreza;
  3. cada vez maior fraqueza negocial do trabalhador perante o empregador e Estado;
  4. tendência para a automatização nesta década. Primeiro atacará os trabalhadores especializados (advogados, engenheiros, bancários, …) e depois os trabalhadores não-especializados (secretariado, telefonistas, motoristas, repositores, armazenistas, …).

Algumas das medidas poderiam ser:
  • em facilitar o teletrabalho (com regras, tal como o PCP defende),
  • a extensão dos dias uteis semanais (de 5 para 6) para impor o trabalho continuo por turnos (3 dias de trabalho para 4 de folga, mantendo a carga horária semanal);
  • impor legislativamente que as empresas com mais de 20 trabalhadores tenham uma comissão de trabalhadores (ou um trabalhador) representada nos órgão diretivos da empresa, e com poder de veto sobre novos investimentos acima de uma certa percentagem do capital social, venda de activos (como por exemplo, instalações e equipamentos de trabalho), e distribuição de lucros. Assim, diminuir-se-ia as descapitalizações, os desvios, a fuga aos impostos e falências dolosas em empresas. (Só uma comissão de trabalhadores altamente corrupta é que permitiria que a sua empresa despedisse 2000 dos seus colegas embora tivesse um lucro de 400 milhões de euros). Poder-se-ia também legislar que, em caso de insolvência ou cessão de atividade de uma empresa, os trabalhadores (através dessa comissão) poderiam transformá-la numa cooperativa de trabalhadores (i.e., os trabalhadores seriam s donos da empresa), em que por dois anos a Segurança Social nem a Autoridade Tributária iriam cobrar as dívidas em falta (podendo no limite as deixar prescrever desde que seja mantida a actividade). Esta legislação corporativa é semelhante à existente na Alemanha, e também serviria como um travão para o assédio profissional.
  • Rendimento mínimo garantido para todo o residente em Portugal. Assim, o trabalhador teria mais força negocial perante o empregador, fazendo com que os ordenados possam subir.

5 A Moralidade. A moralidade atual é “ter dinheiro”: os que têm são sempre bons e até os defeitos e más ações são virtudes. Poder-se-ia alterar para “Viver”. O “herói” português seria um ser multifacetado que trabalha q.b., é ativo politicamente, trata de si próprio, cuida da família, está envolvido numa qualquer associação sem fins lucrativos…

6 A Formação dos jovens. Neste período experimentou-se uma nova forma de formar os jovens. Poder-se-ia alterar o paradigma da Educação: passar do predomínio dos professores e do conteúdo lecionado, para os alunos e para o que os alunos efetivamente aprendem. O novo “aluno” deveria aprender: a se auto-dominar, a tratar de si, a conhecer-se, a relacionar-se, a perceber a sua envolvência na Sociedade, a ser eficaz e eficiente a ganhar novas competências, e a trabalhar eficientemente e eficazmente. A verdade verdadinha é que desconhecemos a Sociedade para a qual estamos a formar jovens. Daqui a 20 ou 30 anos, a Sociedade poderá ser de tal forma diferente que tudo o que é ensinado aos jovens na escola de pouco ou nada lhes servirá.

7 Rendimento mínimo garantido para todos os residentes em Portugal. Repare-se que com esta medida:

  • aumenta poder de todos os cidadãos, perante o Estado, perante o empregador,
  • melhoraria a aquisição de competências e consequentemente a mobilidade social,
  • aumentaria a participação na vida ativa política (e consequentemente diminuiria o desperdício e a corrupção),
  • melhoraria a instalação de uma nova moralidade não assente no dinheiro.

A imposição do Rendimento Mínimo garantido de, por exemplo, de 200€/mês custaria cerca de 24 mil milhões de euros/anos: Mas repare-se que o Estado recuperaria diretamente cerca de 20% por via do IVA. Estes impenhoráveis 200€ fazem parte dos rendimentos sujeitos a IRS. Logo, quem mais recebe pagará mais imposto sobre esse rendimento. Assim, o Estado recuperará talvez mais 20% do Rendimento pago.

A nível de gastos, a implementação deste Rendimento irá diminuir a despesa de apoios sociais, com a Saúde, e com a educação. Talvez mil milhões de euros.

A nível de impostos, os benefícios deste rendimento são a nível de emprego: trabalho melhor renumerado e menos trabalho não pago. Portanto, uma análise custo-benefício da implementação desta medida não seria muito negativa.

Para aqueles que dirão que estas ideias são impraticáveis, lembro que só o são porque a Sociedade Civil não as exige. Vamos começar as exigir?

Enviado por Denúncia Anónima
Segunda-feira, 22 de Junho de 2020 15:11
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